Nova lei prevê direitos trabalhistas a motoristas e entregadores em Portugal


Profissionais que atuam como motoristas ou entregadores por aplicativo, capazes de comprovar uma relação de emprego, terão o direito assegurado de receber um contrato de trabalho a partir desta segunda-feira (1º). A mudança está prevista em uma série de alterações nas leis trabalhistas que entram em vigor no país. Com isso, todos os direitos que se aplicam aos demais trabalhadores em Portugal, como férias, limites de horário e remuneração mínima, também devem ser aplicados a quem atua em plataformas de serviços de transporte ou entrega de comida, por exemplo.

No entanto, diferentemente do que ocorreu na Espanha em 2021, não se trata de uma regulamentação direta, que automaticamente assegura o direito a todos os profissionais da área. O governo português alterou a legislação para que exista uma “presunção” de contrato de trabalho “quando se verifiquem indícios de relação entre plataformas e prestador de atividade entre este e os clientes”. Ou seja, os profissionais precisam provar que possuem um vínculo empregatício na maneira como trabalham, ao contrário do que é esperado de quem atua de forma autônoma. A decisão final, porém, será da Justiça.

Segundo a nova legislação, trabalhadores devem ter um contrato de trabalho, e consequentemente de todos os direitos trabalhistas, caso se enquadrem em “algumas” das seis características que presumem uma relação de emprego e foram elencadas pelo governo. No entanto, o documento não deixa claro quantos itens é preciso cumprir para a comprovação, cabendo ao judiciário definir como o tipo de atuação profissional se enquadra em cada caso.

O primeiro fator que presume vínculo é a fixação da remuneração do trabalho, por parte da empresa, ou de limites mínimo e máximo de pagamento. O segundo ponto é que a empresa determine regras específicas ao trabalhadores quanto ao desempenho do serviço. Em terceiro lugar, está a o controle e supervisão da atividade profissional através de “meios eletrônicos” e algoritmos. 

Outra característica analisada é se a plataforma digital “restringe a autonomia” do trabalhador, com a determinação de horários, a aplicação de sanções e a escolha de clientes. No quinto item da lei está “o poder disciplina” da empresa sobre o profissional, como a desativação da conta de trabalho.

Por fim, poderá existir a presunção de uma relação profissional quando o funcionário utilizar equipamentos que pertencem à empresa ou alugados através de contrato. A alteração em Portugal acompanha uma proposta da União Europeia (UE) do final de 2021, com objetivo de garantir direitos aos trabalhadores da área. De acordo com o último Anuário Estatístico da Mobilidade e dos Transportes (2021), 9.175 operadores de transporte por aplicativo estão inscritos em Portugal.

Multas

As alterações na lei preveem que os empregadores, seja a própria plataforma ou intermediários, paguem multas caso contratem os profissionais como autônomos, mas com características de contrato de trabalho que “possam causar prejuízo ao trabalhador ou ao Estado”. As multas aplicadas serão baseadas no valor de unidades de conta processuais (UC), atualmente em 102 euros. No caso da nova legislação, o descumprimento se enquadra na classificação mais alta das multas, chamadas de “contraordenação muito grave”, que começa em 3UC, ou seja, 306 euros.

Em caso de reincidência, as empresas ainda podem receber sanções como impedimento de participação em concursos públicos por dois anos. Outra medida é a perda de direito a subsídios ou benefícios fiscais também por um período de até dois anos. 

A mudança na relação trabalhista para motoristas e entregadores é uma das 150 alterações no Código do Trabalho em Portugal, uma discussão que levou meses. Foi também o ponto de maior debate entre os partidos na Assembleia da República.

Em uma sessão parlamentar no mês passado, a Associação Nacional Movimento TVDE, que representa os empresários do setor, defendeu a “liberdade contratual”, levando em consideração as características da área. Segundo Ivo Fernandes, que representou a entidade na sessão, a liberdade de contrato permite que “tanto operadores possam assumir o risco do negócio, como possam definir que pretendem apenas explorar os instrumentos de trabalho e passar esse risco de operação aos motoristas”.

Já o Partido Socialista (PS), que governa o país e foi o único partido que aprovou a lei final, defende que as mudanças “reforça o direito dos trabalhadores”. Segundo Eurico Dias, líder da bancada socialista, a nova legislação é um “progresso” nos direitos trabalhistas em Portugal.

Outras alterações na lei

A partir desta segunda-feira (1º) também entram em vigor outras alterações aos trabalhadores do país. Uma delas é que não será mais necessário fazer uma consulta médica em casos de não comparecimento ao trabalho por motivos de saúde. A nova regra determina que uma ligação para o Serviço Nacional de Saúde (SNS), através do SNS 24, será suficiente e vai funcionar como um atestado médico, mediante o chamado “compromisso de honra”.

Esse tipo de licença poderá ser solicitada duas vezes por ano, por períodos máximos de três dias. Assim como já ocorria em caso de ausência no trabalho após a realização de consulta médica, esses dias não são remunerados.

Além disso, a licença paternidade passará de 20 para 28 dias e a de falecimento de cônjuge aumenta de cinco para 20 dias. Também foi criada uma licença de luto gestacional de até três dias. A lista completa das mudanças pode ser conferida através deste link

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